23 de out. de 2012

Manual avançado para a fabricação de nuvens


Arthur C. Stendell em seu manual[1] sobre a fabricação de nuvens, especifica algumas medidas importantes a serem tomadas quando alguém estiver disposto à produção, tanto em massa, quanto em pequena escala – talvez visando apenas um comércio local – de tipos de nuvens para comércio. Entre elas podemos citar primeiramente a importância da observação meticulosa e paciente das condições atmosféricas do local onde se pretende abrir o negócio. Sim, porque a fabricação de nuvens é regida por um órgão que não admite a troca de local do estabelecimento – querendo com isso evitar o monopólio de um único fabricante, ou pior, a guerra entre eles. É o local que determina a quantidade, forma e estrutura da nuvem a ser fabricada.
         Ainda em seu manual, na página sessenta e quatro ele explica:

  “Para que haja a formação de nuvens é necessário que parte do vapor d’água contido na atmosfera se condense, formando pequenas gotículas de água, ou solidifique, formando minúsculos cristais de gelo. A esta formação, ou aglomerado de cristais de gelo e gotículas damos o nome de nebulosidade.”[2]

         Sabe-se ainda que, neste mesmo livro[3] ele expõe os pormenores de toda a parte burocrática com relação às especificações de “nuvens para chuva” e “nuvens para simples decoração do espaço aéreo”, incluindo as coordenadas estabelecidas de sua área de abrangência e a altura, esta determinada exclusivamente para cada tipo de nuvem.
         Saber exatamente onde e como fabricar sua própria nuvem é essencial para o bom andamento do negócio. As especificações técnicas que abrangem entre outras áreas a segurança, também podem ser encontradas no livro “Normas Técnicas para a Condensação da Água para a Fabricação de Cristais de Gelo.”
         Mas não vou falar aqui da parte burocrática nem técnica, que certamente não é a que mais interessa o leitor neste momento, falarei do processo de fabricação e dos modos – particulares – do exercício da preparação.
         Se o leitor quiser se aprofundar ainda mais no tema, sugiro que leiam W.C. Scotty[4], que narra sua aventura particular com uma de suas nuvens mais famosas.
         Particularmente acho que algumas pesquisas na internet também irão ajudar no momento da escolha do tipo certo de nuvem que se quer fabricar. Alguns designs são simplesmente incríveis.
         E vejam só, pode-se inclusive, comprar um kit com cristais de gelo e canhão de 12 polegadas, ou uma incrível máquina que prepara sozinha a nebulosidade. No caso do kit, você vai precisar contratar os serviços de uma empresa que prepare a nebulosidade e a carregue até a altura ideal para seu tipo de nuvem, e claro uma licença municipal, estadual ou federal para usar o espaço aéreo no local determinado, dependendo do tipo de empresa que você tem. Empresas locais necessitam apenas de uma licença da prefeitura. Já a máquina que prepara a nebulosidade, esta sim já vem com todas as licenças para uso geral-padrão, é bem mais caro, mas dependendo do tamanho do seu negócio, vale o investimento.
         Em 1860, a fabricação de nuvens, de chuva[5] ou decorativas era um negócio pouco explorado, mas como sabemos a necessidade é a mãe das invenções, e Juan Estorero inventou e patenteou uma máquina que fabricava os cristais em 1861[6].
         Em sua casa na cidade de Charaña na divisa com o Chile, Estorero observava um céu claro – completamente azul -  e sem uma única nuvem para lhe aguçar a imaginação – como na brincadeira de criar coisas ou animais com as formas das nuvens.
         E pensou que num dia tão belo quanto aquele, as pessoas não deveriam passar seus momentos sem um ofício para a mente, e inclusive, pensou também no fato de que, sem as nuvens, o dia ficava muito mais quente que de costume, e assim, de uma necessidade e um capricho, inventou a primeira máquina de fabricar cristais de gelo condensando-os para criar nuvens. Ainda nesta época não existiam os canhões que arremessavam os cristais na atmosfera criando a nebulosidade.
         De qualquer maneira começa nesta época a fabricação de nuvens decorativas, que hoje se constitui numa arte para poucos gênios do design.
         Quanto ao aspecto: a aparência geral de uma pessoa pode indicar aos nossos olhos e sentidos se ela é agradável ou não a nós, isto também acontece com as nuvens. Quando olhamos para as cinzas sabemos que há probabilidade de chover, enquanto que se ela é totalmente branca nos traz um sensação de beleza e frescor. Então imagine que uma pessoa cinza é uma nuvem de chuva e outra bonita é uma nuvem branca. Não, não pense nada disso, isto é preconceito, nem pessoas nem nuvens merecem isso.
         Quanto à constituição: imagine um aglomerado de pessoas de mesma condição sócio-econômica ou credo por exemplo, isto se denomina uma constituição. Entre elas existem as otimistas, as pessimistas e as realistas, criando assim uma espécie de divisão de grupos. Com as nuvens acontece a mesma coisa. Existem as sólidas, as líquidas e as mistas, que embora sejam uma constituição de nuvens também estão dividas em classes. E pensando bem não é bom para as pessoas serem divididas em classes, pois isso geraria uma luta entre elas, criando uma divisão nada agradável de castas que lutariam pelo poder, constituindo assim uma dominação desigual, pois os mais equipados teriam mais vantagens que desvantagem nessa luta. Com as nuvens também não seria legal, principalmente porque um profissional do ramo não pode escolher qual tipo de nuvem é mais bonita ou agradável que outra, pois isso geraria um caos orçamentário, sem contar que órgãos federais exigem e fiscalizam a isonomia dos tipos de nuvens em todo o território nacional.
         Quanto ao estágio: a produção industrial advinda da revolução acontecida no fim do século dezenove, produziu uma espécie de explosão tecnológica e financeira no mundo, dividindo as pessoas em classe sociais cada vez mais diferenciadas, ou seja, os ricos enriqueceram muito mais, os pobres continuaram pobres e, ao invés de plantar sua própria comida, viraram empregados dela, pois o emprego em fábricas e indústrias mudou essa relação do homem com a terra e seus produtos. Evidenciou-se muito mais as diferenças das classes sociais. Com as nuvens podemos dizer – numa metáfora tardia – que essa relação é muito parecida: existem as baixas, as médias e as altas.
         Por ser tratar de uma condição de nossa mente, subjetivar as coisas é normal, e não poderíamos deixar de fazê-la com as nuvens. Assim, as baixas são as menos importantes, as médias são simpáticas e as altas são as mais belas e melhores.
         Mas deixando de lado toda essa idiossincrasia com relação à fabricação de nuvens, é pertinente dizer que vale mesmo o feeling nessas horas.
         Faço aqui um breve relato particular de como consegui produzir a minha primeira nuvem, e é claro, não posso esquecer de dizer que: se você não tem uma mente criativa que fixe a priori a idéia da nuvem dentro de sua cabeça antes mesmo de sua confecção, não há porque nem sentido em começar a fabricá-la fisicamente.
         Um estado de bom humor e aceitação já é um bom começo, os estágios mais avançados requerem um nível de concentração que você só encontrará na meditação, na yoga etc...
         Faça, logo que acordar e ainda em sua cama, uma prece dirigida a qualquer coisa que você creia, não importa se é física ou não, isto serve para liberar a endorfina[7] acumulada durante o sono. Isto serve para ligar o motor da mente criativa. Em seguida, com os pés descalços pressione os dedos contra o chão, um de cada vez, apoiando a mão na cama para ter uma pressão mais uniforme. Esse exercício serve para endurecer as pontas dos dedos – vai que hoje seu carro quebrou e terá de ir trabalhar de ônibus.
         Veja bem, não há motivo para estresse. Lembre-se de que estás prestes a criar sua primeira nuvem e o equilíbrio emocional é muito importante.
         Arranje um horário em que não será incomodado por ninguém e deite com as costas contra o chão, fixe seu olhar no céu num ponto em que não haja uma nuvem já pronta, pense em como a sua relação com o mundo à sua volta determina suas atitudes, pense na relação de perda e ganho com você mesmo, sinta-se parte da paisagem.
         Viu? Não é tão difícil assim. Seguindo estes passos, uma imagem será criada em sua mente, então transfira essa imagem para o papel em palavras, diga como está se sentindo. Então espere o dia seguinte e, novamente quando acordar, pegue este papel e crie a imagem de uma nuvem baseado no texto.
         Pronto, você acaba de criar sua primeira nuvem.
         Para saber como criar tempestades, leia meu mais novo livro “Criando tempestades em onze passos”, da editora costa-prado.


[1] Stendell, A.C. - How Do I Make My First Cloud. São Paulo, 1989. ECP/BR
[2] Stendell, A.C. - How Do I Make My First Cloud. São Paulo, 1989. ECP/BR, p. 64

[3] idem, p.98
[4] Scotty, W.C. – My favorite Cloud. NY, 1994 – Sem tradução para o português.
[5] É necessário explicar que, para a fabricação de nuvens de chuva, o processo é bem mais complicado que apenas nuvens para decoração. Existe todo um aparato químico que não entrarei em detalhes nesta obra, fixando-me apenas na arte de fabricar nuvens decorativas.
[6] “Rain Machine”. Para encontrar mais sobre o inventor acesse HTTP://www.rainmachineestorero.com.bo
[7] Qualquer de certos peptídeos que ocorrem no cérebro, na hipófise e outros tecidos de vertebrados, capazes de produzir ação antálgica prolongada, e cujos efeitos se assemelham aos da morfina.


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